16/02/2017
Todos os anos, desde 1964, a Conferência Nacional dos Bispos do
Brasil (CNBB) apresenta a Campanha da Fraternidade como caminho de conversão
quaresmal, indicando-nos como itinerário a oração, jejum e esmola, graça que se
abre a todos e nos faz experimentar a espiritualidade pascal capaz de provocar
e gerar, ao mesmo tempo, a conversão pessoal, comunitária e social para
cultivar o seguimento de Jesus Cristo.
Aos poucos, os temas da Campanha ganharam amplitude, sendo
refletidos no seio da Igreja e seus horizontes foram alargados, passando a
ganhar a adesão de diferentes segmentos da sociedade, criando uma cultura de
fraternidade, apontando princípios de justiça, denunciando ameaças e violações
da dignidade e dos direitos, abrindo caminhos de diálogo e de solidariedade na
busca de soluções dos problemas que afligem a sociedade brasileira e que, em
alguns casos, estão coligados com questões de grande relevância global.
“Fraternidade: biomas brasileiros e defesa da vida” é o tema da
Campanha para a Quaresma 2017. O lema é inspirado no texto do Livro do Gênesis
2,15: “Cultivar e guardar a criação”. A Campanha tem como objetivo geral:
“Cuidar da criação, de modo especial os biomas brasileiros, dons de Deus, e
promover relações fraternas com a vida e a cultura dos povos, à luz do
Evangelho”. Esse tema da Campanha da Fraternidade já discutido em Assembleia
das pastorais sociais e aprofundado pelos vicariatos agora, neste sábado dia 18
de fevereiro, é lançado oficialmente em nossa arquidiocese. Recomendamos que o
livro da Campanha da Fraternidade em Família 2017 elaborado em nossa
Arquidiocese seja o texto que acompanhe as nossas reflexões de grupos durante
este tempo, aproveitando também o tema do ano mariano e familiar. Assim
estaremos unidos nessa caminhada pastoral tão importante nessa nossa grande
cidade.
O tema deste ano fala de Biomas: bioma quer dizer a vida que se
manifesta em conjunto com espécies de vegetação similar e contínua, animais,
clima mais ou menos uniforme num espaço geográfico cuja formação tem uma
história comum. A partir desse simples conceito e da unidade dos diversos
elementos que o compõem cada um dos seis biomas brasileiros, chegamos a
conclusão quão extraordinária é a beleza e diversidade da natureza de nosso
país, das quais cada cristão é chamado a ser cultivador e guardador da obra
criada.
Considerando a realidade particular da Cidade do Rio de Janeiro,
localizada no bioma Mata Atlântica, patrimônio ecológico e cultural que se
estende ao longo do que hoje são 17 estados, a Campanha nos convida a olhar
mais atentamente para esse bioma que, apesar de sua relevância, está ameaçado
por atividades econômicas predatórias; ausência de saneamento básico;
concentração populacional; crescimento urbano desordenado e concentração de
riquezas; desmatamentos; morte e tráfico de espécies; poluição das águas,
violação dos direitos das populações tradicionais; falta de consciência
ecológica de uma parcela significativa da população e falta de compromisso
político que agrava a degradação do meio ambiente.
A realidade dos biomas brasileiros também se insere no cenário
da crise ecológica global e das graves implicações sociais das mudanças
climáticas que afetam, sobretudo os mais pobres. Para além das questões
econômicas e políticas nos diferentes níveis e contextos, cultivar e guardar a
criação é uma questão de sobrevivência.
Não podemos ficar indiferentes a essas realidades e cada pessoa
é chamada a responder também de maneira individual a partir de uma mudança de
comportamentos e do próprio padrão de consumo.
O Santo Padre, o Papa Francisco, em sua 'Encíclica Laudato Si'
convida as sociedades a ouvir os gemidos da Criação, exortando todos a uma
conversão ecológica, a mudar de rumo, assumindo a responsabilidade de um
compromisso para o cuidado da casa comum. “Laudato Si, mi Signore” (Louvado
sejas, meu Senhor), assim cantava Francisco de Assis ao dar graças ao criador
pela mãe terra e tudo o que ela produz.
Dessa forma, o Santo Padre propõe mudanças imediatas de
reflexões e maturação humana inspiradas na experiência cristã e critica os
abusos e o uso irresponsável dos bens que Deus colocou à disposição dos homens,
ao lembrar dos sintomas de doença que se pode notar no solo, na água, no ar e
nos seres vivos.
A encíclica pretende despertar a sociedade para os gritos de uma
terra oprimida e devastada pelo pecado e egoísmo humano, pois quando o homem se
torna indiferente a essa realidade, também corre o risco de ser vítima dessa
degradação.
O Santo Padre apresenta a ecologia integral como novo paradigma
de justiça; uma ecologia "que integre o lugar específico que o ser humano
ocupa neste mundo e as suas relações com a realidade que o circunda". Ao
salientar a importância da ecologia integral, ele afirma que os seres humanos
estão profundamente ligados entre si e à criação na sua totalidade.
O Santo Padre se dirige a cada pessoa que habita neste planeta e
faz um apelo, sobre o urgente desafio de proteger a “casa comum” e inclui a
preocupação de unir toda a família humana na busca de um desenvolvimento
sustentável e integral, convidando-a a renovar o diálogo sobre o futuro do
planeta.
Abordando a realidade dos biomas brasileiros e as pessoas que
neles residem, esta Campanha da Fraternidade deseja despertar as comunidades,
famílias e pessoas de boa vontade para o cuidado e cultivo da casa comum.
Diante dos grandes desafios ambientais da cidade e fiel ao compromisso de
defender e promover a vida, a Arquidiocese do Rio de Janeiro apresenta a seguir
algumas ações de caráter geral, e também especifico para o bioma Mata
Atlântica, no qual estamos inseridos:
1. Reduzir o consumo.
Esta é a primeira e principal ação de preservação do meio
ambiente em todos os níveis. Cada item produzido corresponde à utilização de
recursos naturais que irão gerar algum impacto sobre o meio ambiente.
2. Fundar a Pastoral da Ecologia nas paróquias da Arquidiocese
onde ainda não exista.
Essa pastoral é responsável por desenvolver ações locais
voltadas à conversão ecológica da comunidade a partir do conceito de ecologia
integral apresentado pelo Santo Padre, na Encíclica Laudato Si. As paróquias
que já contam com a pastoral podem incentivar e apoiar a criação de outras
pastorais nas outras paróquias do seu vicariato, além de promover curso de
formação e/ou capacitação de agentes da pastoral, debates, e fóruns locais
sobre meio ambiente.
É fundamental promover ações de educação ambiental para
sensibilizar, criar consciência ecológica e o compromisso comunitário com
a temática ambiental, que é transversal e pode ser trabalhada desde a infância.
A Campanha da Fraternidade deseja, antes de tudo, levar à admiração para que
todo o cristão seja um cultivador e cuidador da obra criada.
3. Reciclar os resíduos que produzimos e destiná-los corretamente.
Grande parte dos resíduos que produzimos pode ser reciclado e
são bem-vindas ações como a divulgação de informações sobre o descarte adequado
de resíduos; coleta seletiva; economia de energia e água, aproveitamento máximo
de alimentos, redução de desperdícios, feiras de troca são medidas ao alcance
de todos e muito eficientes. A coleta seletiva de papel, latas de alumínio,
embalagens pet e óleo de cozinha podem, inclusive, gerar renda para fomentar
novas ações. Para essa ação temos convênios já funcionando.
4. Acompanhar a implementação do Plano de Saneamento Básico do
Município do Rio de Janeiro.
Essa ação deve ser conduzida pelo conjunto das pastorais
sociais, em nível arquidiocesano, a partir do acompanhamento e fiscalização do
legislativo e do executivo, com a realização de debates e articulações
(inter)vicariais com a participação dos cidadãos, profissionais e entidades
interessadas em soluções viáveis para o déficit de saneamento básico sobretudo
em regiões de extrema vulnerabilidade social. O Vicariato da Caridade Social
acompanhará esse trabalho. As paróquias podem também estimular e viabilizar a
capacitação necessária à participação dos leigos e leigas nos conselhos de
direitos voltados para defesa do meio ambiente ou a ele correlatos.
5. Acompanhar a implantação e a revitalização de áreas de proteção
ambiental.
As ações de reflorestamento, recuperação de matas ciliares e de
proteção aos parques existentes devem ser acompanhadas e fiscalizadas para
garantir sua preservação. A Floresta da Tijuca é um exemplo bem sucedido de
reflorestamento iniciado no século XIX que recompôs a Mata Atlântica. Além da
limpeza das nossas águas a busca do plantio de árvores deve ser uma atividade
incentivada.
6. Apoiar a produção agroecológica e a agricultura familiar.
Incentivar ações e grupos de economia solidária para a produção
e comercialização em feiras agroecológicas. Há diversas experiências em curso
que promovem o comércio justo e solidário, beneficiando toda uma cadeia
produtiva que contribui para aumentar os níveis de segurança alimentar e
melhorar o cardápio e saúde da população.
7. Estimular o plantio de hortas comunitárias.
Onde houver espaço e recursos, incentivar o plantio de hortas
orgânicas ou pomares sem a presença de agrotóxicos. Valorizar o saber e a
cultura de pessoas que tinham o hábito de plantar e que gostem de transmitir
essas experiências às novas gerações se insere na temática da Campanha da
Fraternidade.
Estas e outras iniciativas que possam surgir da criatividade em
nossas comunidades nos acompanharão, não apenas nestes 40 dias, mas em uma
mentalidade responsável que se cria com as reflexões sobre tão importantes
temas. As sugestões são para que o tempo de conversão quaresmal nos leve ao
compromisso com o outro, com o futuro na preservação do meio ambiente conforme
o tema da Campanha da Fraternidade deste ano e, portanto, conto que teremos
estes e outros gestos concretos em nossas paróquias.
Rezemos
"Oração da Campanha da Fraternidade 2017":
“Deus,
nosso Pai e Senhor, nós vos louvamos e bendizemos, por vossa infinita bondade.
Criastes
o universo com sabedoria e o entregastes em nossas frágeis mãos para que dele
cuidemos com carinho e amor.
Ajudai-nos
a ser responsáveis e zelosos pela Casa Comum.
Cresça,
em nosso imenso Brasil, o desejo e o empenho de cuidar mais e mais da vida das
pessoas, e da beleza e riqueza da criação, alimentando o sonho do novo céu e da
nova terra que prometestes. Amém!
Dom Orani João Tempesta
Arcebispo da Arquidiocese de São Sebastião do
Rio de Janeiro
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